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sábado, 7 de março de 2015

ΑΩ - O Jesus Histórico


Os miticistas, um tanto quanto ironicamente, prestam  um desserviço aos seus leitores humanistas. Ao firmar uma posição que quase ninguém mais aceita, eles se expõem ao ridículo e a acusações de desonestidade intelectual. No entanto, isso é totalmente desnecessário para alcançar seus objetivos. É evidente que, para os miticistas, a fé em Jesus é um problema. Mas o problema de Jesus não é que ele seja um mito inventado pelos cristãos primitivos - isto é, que ele nunca tenha sido um personagem real no palco da história. O problema de Jesus é justamente o contrário. Como Albert Schweitzer percebeu há muito tempo, o problema do Jesus histórico é que ele era histórico demais.



Muitos televangelistas, pregadores cristãos populares e donos daquelas empresas que chamamos de megaigrejas, compartilham uma visão moderna irrefletida sobre Jesus - a de que ele pode ser fácil e quase automaticamente traduzido para uma linguagem moderna. O fato, no entanto, é que Jesus não era uma pessoa do século XXI que falava a língua ocidental cristã moderna; Jesus era inescapável e irrefutavelmente um judeu da Palestina do século I. Ele não era igual a nós, e se tentarmos recriá-lo à nossa imagem, transformaremos o Jesus histórico numa criatura inventada para nós e nossos propósitos.
Jesus não se reconheceria na pregação da maioria de seus seguidores atuais. Ele não sabia nada de nosso mundo. Ele não era capitalista. Ele não acreditava na livre iniciativa. Ele não defendia o acúmulo de riquezas ou das coisas boas da vida. Ele não acreditava em educação em massa. Ele nunca ouvira falar em democracia. Ele não tinha nada a ver com frequentar igreja. Ele não sabia nada de previdência social, cupons de alimentação, bem-estar social. Até onde sabemos, não expressou nenhuma opinião sobre as questões éticas que nos atormentam hoje em dia: aborto e direitos reprodutivos, casamento entre pessoas do mesmo sexo, eutanásia ou bombardeios no Irã. 
Seu mundo não era o nosso, suas preocupações não eram as nossas e, mais surpreendente ainda: suas crenças não eram as nossas.

Jesus foi um judeu do século I, e quando tentamos transformá-lo, por exemplo, em um latino-americano do século XXI distorcemos tudo o que ele era e tudo aquilo que representava. Jesus era completamente sobrenaturalista. Acreditava no Diabo e em demônios e nas forças do mal agindo neste mundo. Ele sabia pouco (ou quase nada), sobre o funcionamento do Império Romano. Mas o pouco que sabia considerava nocivo. É possível que considerasse toda forma de governo nociva, a menos que fosse uma teocracia (futura) a ser governada por Deus por meio de seu messias.
Ele certamente não defendia nossas visões políticas, sejam quais forem no momento.

Essas forças do mal estavam impondo seu controle sobre o mundo de maneira cada vez mais vigorosa. Mas Jesus achava que Deus iria intervir em breve e destruir todas elas para trazer Seu reino à terra. Isso não viria de esforço humano, viria de Deus, quando Ele mandasse um juiz cósmico para destruir a ordem atual e estabelecer o reino de Deus aqui na terra. Isso não se tratava de uma metáfora para Jesus. Ele acreditava que seria assim, e logo, dentro de poucos anos, na sua geração.
Jesus se enganou quanto a isso. Ele se enganou sobre muitas coisas. As pessoas não querem ouvir isso, mas é verdade. Jesus era um homem de sua própria época. E, assim como homens e mulheres de suas próprias épocas se enganam sobre tantas coisas, o mesmo ocorreu com Jesus, e o mesmo ocorre conosco.

Portanto, o problema de Jesus é que é impossível removê-lo de sua época e transportá-lo para a nossa sem recriá-lo completamente. Quando o recriamos, não temos mais o Jesus da história, mas o Jesus de nossa imaginação, uma invenção monstruosa criada para servir aos nosso propósitos. Mas não é tão fácil assim transplantar e modificar Jesus. Ele é extremamente resistente. Ele permanece sempre em sua própria época. Conforme os modismos sobre Jesus vêm e vão, e novos Jesus são inventados e desaparecem, substituídos por Jesus ainda mais novos, o Jesus real, histórico, segue existindo no passado. Ele era o profeta apocalíptico que esperava a ruptura cataclísmica ainda no tempo de sua geração, com Deus destruindo as forças do mal, estabelecendo seu reino e instalando o próprio Jesus no trono. Esse é o Jesus histórico. E ele é obviamente histórico demais para o gosto moderno. É por isso que tantos cristãos tentam reformá-lo hoje em dia.      


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